sexta-feira, 24 de abril de 2015

31º Capitulo: “Eu não vou, nem quero ver o jogo”

- A sério, Renae. Deixe-a ficar.
- Mas vocês precisam de descansar…de estar sozinhos, se calhar –
Mary Alice queria ficar em casa de Marco e Milicent. Queria passar o resto do dia com eles e dormir lá. Renae estava reticente a isso, imaginando que ela iria ser um fardo para eles – além do mais o Marten é pequeno, sabem lá se a vossa noite é descansada…
- Mãe, a sério…ela pode ficar. Daqui a nada vamos jantar, depois ela vê aí os bonecos connosco e dorme. Ela não dá trabalho, a sério.
- Porque é que não deixamos para outro dia? –
Propôs Hinrich.
- Noutro dia o Marten já não é pequenino como hoje… - Mary Alice, que estava perto da alcofa de Marten, falou olhando para todos – eu porto-me bem e eles nem se vão cansar comigo.
- Ela tem razão, mãe…
- Tens a certeza, Mili?
- Tenho –
Milicent chegou perto da mãe, dando-lhe dois beijinhos – vão para casa, descansem e amanhã venham buscá-la quando quiserem. A sério…ela fica bem aqui connosco.
- Nós sabemos disso –
disse Hinrich, chegando perto da filha – mas não queremos que tenham mais trabalho.
- Ela não dá trabalho, a sério –
comentou Marco, puxando a menina para ao pé dele. Começou a fazer-lhe cócegas e todos acompanharam as gargalhadas de Mary Alice com sorrisos.
Renae e Hinrich despediram-se de todos, pedindo a Mary Alice que se portasse bem.
- Obrigada por me deixarem ficar com vocês. Eu prometo que me porto bem – Mary Alice deitou-se ao lado de Marco, deixando a sua cabeça nas pernas dele. Milicent, por alguns segundos, ficou a olhar para eles dois.
Sentia, a cada dia que Mary Alice passava junto deles, que Marco a considerava mesmo irmã de sangue, ou até mesmo irmã de Marco. Cuidava dela como se fosse mesmo família e olhava-a com um brilho especial nos olhos. Por muito que quisesse ficar ali, parada, a olhar para eles, Milicent teve de se mexer e preparar o jantar para os três. Nada muito elaborado e rápido de se fazer.



- Posso entrar? – Perguntava Marco à porta da casa de banho.
- A Mili está quase despida! – Respondeu Mary Alice um pouco aflita. A menina estava a tomar banho, enquanto Milicent amamentava Marten, sentada na sanita tomando conta de Mary Alice.
- Mas isso não faz mal, Mary…o Marco é meu namorado.
- E ele pode ver-te assim?
- Pode…
- O que é que vocês estão a segredar aí dentro? –
Marco ainda não tinha entrado, percebeu que Mary Alice não estava muito à vontade com aquela situação.
- Espera, Marco, espera – disse-lhe Milicent – se quiseres ele não entra, assim tomas banho sossegadinha.
- Não tem mal…eu não tenho maminhas, ainda!
- A sério? Se não quiseres eu mando ele ir para o quarto.
- Entra, Marco! –
Milicent riu-se, depois de Mary Alice dar autorização ao Marco para entrar na casa de banho. Milicent percebeu que ele estava à vontade com as muletas e, depois de abrir a porta, espreitou olhando para as duas.
- Posso mesmo ou as meninas querem um momento a sós com o meu filho?
- Podes mesmo, Marco. O teu filhinho está a comer e a dormir ao mesmo tempo –
Marco riu-se, encostando-se à porta.
- Não devias ficar assim muito tempo, Marco – alertou Milicent.
- Não há problema, Mili. E, além disso, se ficar o dia todo sentado no sofá fico obeso.
- E com aquela gordura toda o Marco, depois, não pode jogar à bola –
comentou Mary Alice, fazendo com que os dois se rissem. Milicent não estava assim com muita vontade de o fazer. Estar a amamentar Marten só fazia com que as dores aumentassem, algo que não passou despercebido a Marco.
Mary Alice saiu da banheira, cobrindo-se com uma toalha. Marco puxou-a para junto dele, ajudando a menina a limpar-se.
- Agora vamos todos para o quarto, vestir os pijamas e dormir.
- Dormir? Já Mili, ainda é tão cedo e eu estou de férias.
- A mana tem razão, Mary –
disse Marco, fazendo com que as duas olhassem para ele – depois amanhã vais andar com sono o dia todo.
- Mas podemos falar um bocadinho antes de dormir?
- Podemos… -
concordou Milicent.
- E vocês não se importam mesmo que eu durma com vocês? – Mary Alice passou à frente de Marco que a seguiu até ao quarto, enquanto Milicent seguia os dois com Marten ao colo. O menino tinha adormecido e ela acabou por colocá-lo no berço. Ajudou Mary Alice a vestir o pijama daquela noite quente: uma camisola de Marco.
- Nós não nos importamos não, mas tem de ser a Mili a ficar no meio – afirmou Marco.
- Porquê? Eu gostava de dormir no meio de vocês.
- Sabes…depois podes aleijar-te no gesso do Marco, querida. E se eu dormir no meio eu tenho mais cuidado que tu, entendes?

- Sim…vamos, anda – Mary Alice agarrou a mão de Milicent, caminhando com ela até à cama. Milicent sentou-se na cama, ao lado de Marco, e Mary Alice deitou-se ao lado da irmã – a vossa cama é maior que a da mamã e do papá.
- Também já dormiste com eles? –
Mary Alice deitou a sua cabeça nas pernas de Milicent que, de imediato, lhe começou a mexer no cabelo.
- Já e eles disseram que eu não me mexo. Por isso não aleijo ninguém de noite. Marco? – Muito depressa, Mary Alice sentou-se na cama, olhando para Marco muito séria.
- O que é que vem daí… - Marco expressou o que ia pela sua cabeça e, também, a de Milicent. Aquela cara de quem estava a pensar fazer ou dizer alguma não enganava ninguém.
- Eu vi-te na televisão. No dia em que fizeste essa ferida. Estava com o papá e o avô a ver o jogo, sabes?
- Não sabia, não… -
Marco virou o seu corpo para o lado onde estava Mary Alice, deixando a sua cabeça sobre a barriga de Milicent. A rapariga olhava para a pequena Mary Alice, mas começou a mexer no cabelo do namorado…e estava curiosíssima para saber o que mais Mary Alice tinha para dizer.
- Pois, eu estava. E o avô disse que estava feio…eu achava que eras tu, mas depois ele explicou que era a ferida. Marco…tu estás triste, eu vejo isso. Mas olha, é só uma ferida. Ela vai passar – tanto Milicent como Marco sentiram os seus corações bater um pouco mais depressa. Mary Alice tinha a capacidade de os surpreender com pequenas palavras.
- Chega cá – pediu Marco e Mary Alice chegou-se para ao pé dele. Marco deu-lhe a mão, ficando alguns segundos a olhar para ela sem dizer nada.
- Acho que deixaste o Marco sem palavras, Mary…
- Ele precisa de miminhos, Mili –
Milicent riu-se, vendo Mary Alice aproximar-se da bochecha de Marco, dando-lhe vários beijos seguidos.
- Olha que a Mili ainda fica com ciúmes… - comentou Marco, fazendo Mary Alice olhar para Milicent.
- Ficas, Mili?
- Não…ele é tonto.
- Mas, Mary… -
Marco voltou a chamar a menina, preparando-se para falar – sabes quando tu queres muito uma coisa?
- Como assim?
- Por exemplo…queres ir passear a algum sitio especial?
- Gostava de ir ao castelo das princesas.
- Então pronto…se tu quisesses muito, muito mesmo ir ao castelo das princesas e, no dia antes, te dissessem que não podia ser…ias ficar triste, não era?
- Era.
- Foi mais ou menos o que aconteceu comigo. Sabes que o Mario foi para uma viagem muito grande, não sabes?
- Sim. Jogar no Brasil como o Messi e o Ronaldo –
Milicent e Marco acabaram por se rir mas perceberam que Mary Alice sabia o que era o Mundial.
- Pronto…e eu também ia. Mas não posso por causa da ferida. E isso deixa-me triste.
- Oh, mas Marco…tu tens aqui a Mili e o Marten. Depois ele ia ficar sem o papá e a Mili sem o namorado.
- Mas…Mary, era uma coisa que o Marco queria desde pequenino –
Milicent interrompeu, passando com a sua mão pela cara da menina – e eu já sabia que ele ia embora.
- Então…mas não podes fazer essa viagem depois? Quando passar a ferida?
- Não… -
respondeu Marco – nessa altura já acabou lá os jogos onde está o Mario, o Messi e o Ronaldo.
- Nós podemos fazer jogos depois. Lá fora, na relva da tua casa. Assim não ficas tão triste? –
Marco sorriu, sem saber o que dizer.
Aquela conversa de Mary Alice tinha todo o sentido na cabeça da menina e, também, na cabeça de Marco e Milicent. Ela não queria ver Marco triste, não queria que ele andasse cabisbaixo. E, no seu ponto de vista muito peculiar, as coisas eram mais fáceis de resolver do que realmente são. Mas, de certo modo, aquela proposta de Mary Alice tinha feito com que Marco se apercebesse que ela o queria bem.
- Acho que podemos fazer desses jogos – começou por lhe responder – até podemos chamar o Mario…
- E o Messi e o Ronaldo? Podemos? –
Mary Alice parecia ter ganho pilhas novas naquele momento. Os dois riram-se perante a pergunta da menina.
- Esses é complicado de trazer – respondeu Milicent – mas podemos mascarar-nos, como se fosse carnaval.
- Vai ser tão giro. Não ficas triste, assim, Marco?
- Prometo que vou tentar não ficar triste –
Marco não conseguia dizer-lhe que não iria ficar triste…não conseguia porque existiria sempre uma ponta de tristeza mesmo que se sentisse feliz ao acompanhar de perto os primeiros dias de vida do filho.



Milicent acordava com os raios de sol a baterem-lhe na cara. Estranhou todo aquele sossego pela manhã e a cama vazia. Seria assim tão tarde? Levantou a cabeça, vendo que Marten não estava no berço.
- Onde é que foram todos…? – Falou sozinha, sendo surpreendida pela gargalhada de Marco. Olhou para o fundo da cama e lá estava ele. Sentado, a olhá-la e a sorrir – eu estou a sonhar…ou estamos só os dois no quarto?
- Estamos só os dois no quarto estamos…fiz o pequeno-almoço, meu amor –
Marco apontou para o tabuleiro que estava do seu lado e Milicent sentou-se na cama olhando para Marco.
- Ok. Eu estou mesmo a sonhar…e vou acordar dentro de qualquer momento.
- Já não se pode fazer pequenos-almoços à melhor namorada e mãe do Mundo?
- Pode-se, claro que se pode. Deve-se! –
Milicent gatinhou até Marco, rodeando o pescoço dele com os seus braços. Beijaram-se, sem presas. Sentia-se mole…sentia que tinha dormido imenso. Quebrou o beijo, juntando as suas mãos com as do namorado – Mas diz-me…como é que fizeste isto? Onde é que está o Marten e a Mary?
- Vamos por partes: a Marlene tocou à campainha. Como tu não deste por nada, tive de lhe mandar mensagem a dizer para esperar porque estou condicionado. E pronto, depois de lhe abrir a porta, a Mary Alice já lá estava em baixo, a Marlene veio buscar o menino e fizemos o pequeno-almoço –
Marco soltou uma das suas mãos das de Milicent, passando-a pela cara da namorada – e, agora, eles estão lá em baixo. A Marlene está a dar o pequeno-almoço à menina e o nosso menino…ele ainda não se queixou, mas deve estar a ficar com fome.
- Ai…e não podes ser tu a dar-lhe leite? Dói-me as mamas, Marco –
Milicent encostou a sua cabeça no peito de Marco, que lhe passou com as mãos pelas costas.
- Oh minha rainha…se eu pudesse dava, mas essa tarefa só tu a sabes desempenhar na perfeição.
- Será que ele aguenta até terminarmos o nosso pequeno-almoço?
- Se fosse noutra altura…o pequeno-almoço iria prolongar-se assim na cama. Mas, neste momento, acho que ele consegue aguentar… -
e nisto começam a ouvir o choro de Marten intensificar-se – ou então não.
Bateram à porta e, depois de abrirem, Milicent pôde perceber que Marten vinha ao colo de Marlene e Mary Alice seguia-os.
- Alguém quer tomar o pequeno-almoço com os pais… - disse Marlene, olhando para a melhor amiga.
- E eu dava tudo para que as minhas mamas não me doessem.
- Dói-te as maminhas, mana? –
Perguntou, curiosa, Mary Alice.
- Dói…quando tiveres um bebé vais perceber, querida – Marlene passou Marten para o colo de Milicent e, depois de dar um beijo na testa da melhor amiga, saiu do quarto deles com Mary Alice para terminar o pequeno-almoço.





Dezasseis de Junho. Quinze horas e quarenta e dois minutos. O inicio do momento em que tudo mudou naqueles dez dias que tinham passado. Talvez o momento em que Milicent se apercebeu que algo não estava completamente bem. Talvez o momento em que Marco deu a perceber que não estava bem.
- Milicent, o que é que estás a fazer? – Milicent tinha acabado de se sentar no sofá e mudou para o canal que iria transmitir o primeiro jogo da selecção no mundial.
- Vamos ver o jogo. Faltam, precisamente, dezoito minutos para começar.
- Milicent.
- Quê? É o primeiro jogo, está quase a começar e tu sabes que eu gosto de ver os aquecimentos.
- Milicent.
- O que é que foi, Marco?
- Eu não vou, nem quero vou ver o jogo. –
Milicent olhou para Marco, vendo que ele estava com o seu olhar preso no telemóvel.
- Ai...não vais nem queres.
- Não. Por isso podes mudar de canal.
- E tu podes olhar para mim, por favor? –
Marco colocou o telemóvel em cima das suas pernas, olhando para Milicent – Porque é que não vais ver o jogo?
- Achas que é bonito? Estar aqui sentado, com esta porcaria na perna e a ver os outros jogar? Não é por nada mas, se calhar, já pensaste que não seja muito bonito toda esta situação?
- Porque é que estás assim, logo hoje? Ainda ontem prometeste ao Mario que estavas bem, que ias ver o jogo…o que é mudou em 24 horas?
- Não mudou nada –
Marco pegou no comando, mudando de canal. Milicent deixou de ter contacto visual com os olhos do namorado, já que ele voltou a agarrar no telemóvel.
- E dizes tu que não mudou nada. Estás a fugir ao assunto.
- Mas qual assunto?
- Talvez ao que eu te perguntei, não?
- Eu já te disse que não mudou nada. Agora, por favor, tu deixas-me em paz? Deixas de me chatear com esse assunto? –
Marco olhou para Milicent que, naquele momento, percebeu que ele não estava nada bem.
- Chatear-te…é isso que eu faço? Chateio-te?
- Sim. Em relação a este assunto sim. Não sou eu que estou diferente, não fui eu que mudei. Foste tu.
- O quê?
- Sim. Tu entendias-me, Milicent, e agora parece que não.
- Talvez porque eu não te consigo mesmo entender. Talvez porque tu não me deixas entender o que se passa contigo –
Milicent pegou no comando desligando a televisão que a atrapalhava – já pensaste que tu já não falas comigo sobre o que vai nessa cabeça? Que, nos últimos dias fizeste parecer que estava tudo bem e, afinal, não estás bem?
- Talvez porque eu não quero falar, não quero mesmo que me chateiem mais com isto da lesão.
- Sabes que mais? Vou ver a bola, vou para ao pé do Marten que ele não se importa que eu o chateie –
não era aquilo que Milicent queria, realmente, fazer.
Se dependesse apenas de si, ficaria a insistir com Marco para que ele falasse com ela mas, uma vez que ele não demonstra estar bem, Milicent preferiu ir para o seu quarto, com o computador e viu o jogo todo. Sossegada naquele quarto, onde Marten dormiu os 90 minutos que o jogo durou. A Alemanha ganhou 4-0 a Portugal, algo que surpreendeu Milicent e, provavelmente, muitos mais alemães e portugueses.
Quando o jogo terminou pensou que era a altura de ir ter com Marco.
- Eu juro que pensava que o teu pai estava bem. Tu vês como ele anda a sorrir, como prometeu ao tio Mario que via o jogo e como ele até faz brincadeiras sobre a lesão…o que é que lhe deu hoje, filho? – Milicent debruçou-se sobre o berço de Marten, falando para o filho. Mexeu-lhe na barriga tentando encontrar alguma resposta dentro de si. O silêncio que estava naquele momento fez com que fosse audível, a Milicent, o barulho das muletas a aproximarem-se da porta do quarto – se ele vier com aquele ar de cachorro bebé aleijado eu dou porrada ao teu pai – riu-se sozinha…era impossível fazer alguma coisa a Marco.
- Tréguas? – Perguntou Marco ao espreitar pela ranhura da porta.
- Não sei. Sou eu que te chateio não é…? – Milicent aconchegou Marten no berço, saindo do quarto. Encostou a porta olhando para Marco – Se vamos falar é melhor não ser ali dentro. Ele está a dormir.
- Mili…
- Uau, agora até já sou Mili…
- Podes não falar assim para mim? –
Milicent olhou para Marco, encolhendo os ombros – pois ficaste chateada.
- Demoraste quase duas horas a perceber isso? –
Marco olhou para o chão, encostando-se à parede – Desculpa. Não estou a ser nada compreensível – Milicent aproximou-se dele, colocando as suas mãos na barriga dele – Mas tu não estás a facilitar as coisas.
- É difícil Mili…eu andava bem, eu estava bem ontem. Mas hoje é diferente. Hoje…hoje eu podia ter feito o meu primeiro jogo, podia ter pisado a relva daquele estádio…é difícil de acreditar que estou aqui.
- Queres que te belisque?
- Não. Eu sei que é tudo real.
- Marco, eu não quero que pareças bem só para tranquilizar toda a gente. Eu quero, realmente, que estejas bem. Que te sintas bem psicologicamente e eu hoje percebi que não estás. Porque é que te custa assim tanto falar comigo?
- Para além de pediatra queres ser psicóloga?
- Se isso significa que falas comigo…sim quero ser psicóloga.
- É difícil Mili…e eu acho que não quero falar sobre isto, contigo, porque não te quero magoar.
- Tu disseste que eu te chateava…acho que, estando aqui agarrada a ti e a tentar compreender-te, significa que te quero entender e não sair magoada disto. Eu sei que se passa alguma coisa, que nessa cabeça algo não está a bater certo.
- E não está…
- Vês como eu te entendo? Tu é que não queres falar comigo…e eu não sei o porquê.

- Por mais que estes dias ao teu lado, ao lado do nosso filho estejam a ser maravilhosos…eu acho que sabes que eu queria estar lá. Eu hoje sinto que só o meu corpo é que está aqui presente…porque eu não sinto nada – Milicent começou a sentir o seu coração palpitar com mais intensidade que o normal já que Marco tinha começado a derramar algumas lágrimas – por mais felicidade que eu tenha visto ao longo do dia em ti e no Marten, eu hoje não me sinto feliz. Sinto-me mal, estranho e não quero estar aqui. Eu não quero, Mili.
- Marco… -
Milicent levou as suas mãos até à cara do namorado, limpando-lhe as lágrimas – eu sei disso.
- Não devia ser assim…eu devia sentir-me bem contigo e com ele. Devia sentir-me bem aqui.
- Mas…isso, talvez, seja só por causa do jogo. Marco, já pensaste ir ao psicólogo?
- Já. Mas, eu acho que não me iriam entender.
- Os psicólogos conseguem entender muita coisa. Pode demorar…mas eles conseguem.
- Importas-te que eu vá dormir?
- Claro que não…eu levo o Marten para baixo.
- Não. Deixa-o ficar comigo –
Marco olhava para Milicent implorando que não levasse Marten.
- Tudo bem…se ele precisar de alguma coisa, eu venho cá depois – Milicent afastou-se do namorado, tentando respirar fundo. Virou-lhe as costas, pensando no que ele tinha dito ele não quer estar aqui.
- Mili? – A rapariga já estava a descer as escadas mas, assim que ouviu Marco chamá-la, olhou para ele.
- Sim… - a voz saiu-lhe mais baixa do que o normal, estava triste…por Marco se sentir assim.
- Eu…eu peço desculpa.
- Está tudo bem, Marco. Eu amo-te.
- E eu amo-te a ti, Mili. Mesmo e não duvides disso mesmo que eu diga que não queria estar aqui.
- Eu não duvido… -
aquela era a verdade, Milicent não duvidava do que ele sentia ou do que ambos sentiam um pelo outro. Mas, por outro lado, Milicent não estava confortável com toda aquela situação que viviam.



- Ele disse-te que não queria estar aí?
- Disse. Mas eu entendo…
- Ele está é a precisar de um abanão, Mi.
- Ou se calhar precisa de ficar sozinho –
Milicent tinha de falar com alguém e optou por faze-lo com Marlene.
- O que é que estás a pensar fazer?
- Sinceramente? Não faço a mínima ideia. O que é que farias na minha situação?
- Acho que ligava para ti
as duas riram-se ouve, eu não sei bem o que te posso dizer ou até fazer. Mas o Marco está a passar por uma fase complicada…tentem falar, ou ele ir ao psicólogo Milicent estava deitada no sofá, olhando o teto, mas foi surpreendida pela chegada de Marco à sala…oh não aquele ar de cachorro abandonado e se houver algo que eu possa fazer, diz.
- Queres adoptar um cachorro?
- Que?
- É aquilo que eu tenho na minha frente. Um cachorrinho triste, com duas muletas atrás, loiro e que até conseguiu sorrir agora! Milagre! –
Milicent e Marlene riram-se, enquanto Marco se sentou ao fundo do sofá junto dos pés de Milicent.
- Dispenso esse cachorro, trata tu dele.
- Vou tentar. Vá, beijinhos e obrigada por me ouvires um bocadinho.
- Beijinhos e cuida de vocês. E bate-lhe, se for necessário
as duas riram-se e Milicent acabou por desligar a chamada.
Ficou alguns segundos a olhar para Marco, até que se sentou no sofá, na ponta oposta à de Marco.
- Anda para aqui – Milicent fez-lhe sinal para que ele se deitasse ao lado dela. Marco deitou-se, deixando a sua cabeça sobre a barriga de Milicent – não ias dormir?
- Dei por mim a pensar: eu fui um valente otário.

- Marco…
- Mili, eu fui. Eu sei que fui. Tu não tinhas de ouvir aquilo, não tinhas de levar com tudo em cima. Porque tu me fazer sentir bem aqui, fazes com que esta casa seja nossa, fazes com que seja um lar, com que sejamos uma família –
Marco levantou a cabeça, olhando para Milicent que depressa levou as suas mãos à cara do namorado – é verdade que eu sonhei com aquele mundial, que sonhei estar lá e jogar. Mas também é verdade que não sonhei com nada disto e agora tenho. Existes tu, o nosso filho e uma vida a três. E eu não tinha o direito de ser o parvo que fui.
- Olha, mas sabes uma coisa? É por nos teres a nós que precisas de falar comigo, ou até com o Marten. Ele é, realmente, um óptimo ouvinte –
Milicent sorriu piscando o olho a Marco – mas eu preciso mesmo que fales comigo sobre tudo. Eu preciso de te entender para te ajudar, para passares esta fase menos boa e voltares a ter aquele sorriso que só tu tens. Tens vindo a sorrir muito nos últimos dias…mas ainda não é aquele sorriso a que eu me habituei, sabes?
- Ajuda-me –
Marco deixou a sua cabeça cair sobre o peito de Milicent, que se queixou das dores que tinha com um gemido prolongado – desculpa.
- Não faz mal…mas agora deixa-te ficar sossegado. Por favor.
- É melhor mudarmos de posição, se calhar.
- Sim, meu amor, é mesmo melhor –
Milicent deitou-se ao lado dele, encostando a sua cabeça no peito dele – assim está melhor.
- Como é que tu consegues aturar-me?

- Oh Marco, por favor – Milicent olhou para o namorado, dando-lhe um beijo mais longo, mais demorado, carregado de entrega e sentimento – acho que, desde que estamos juntos, cresci contigo. Fizeste-me ver, sentir e conhecer coisas que eu não sabia que eram possíveis existir. Eu não te aturo, eu amo-te e pretendo ficar cheia de rugas do teu lado, com cabelos brancos e montes de filhos e netos a darem-nos miminho – Marco esboçou um sorriso e Milicent passou com a sua mão pela cara do namorado – ensinas-me todos os dias a amar-te, a respeitar o outro e a ser uma mulher. Tornaste-me uma mulher completa. Não te aturo, eu vivo contigo e para te ver sorrir, para celebrares vitórias, para fazermos bebés – Milicent mordeu o lábio superior de Marco, roçando o seu nariz com o dele – és tudo para mim, és tudo para o nosso filho. Sabes que eu invejo a relação que tens com ele? – Marco olhou-a confuso e ela riu-se – A sério! Ele abre os olhos cada vez que te ouve, ele está sempre a segurar o teu dedo quando está ao teu colo, ele cala-se assim que és tu a pegar nele a meio da noite…és o melhor pai do mundo, o melhor namorado e eu só quero que tu estejas bem ou que, pelo menos, tentes ficar.
- És tão lamechas tu…
- E mesmo assim és tu que estás aí a chorar –
Milicent riu-se, limpando a lágrima que caia do olho esquerdo de Marco.
- Eu prometo que vou tentar falar contigo sempre que me sinta assim como hoje. Mas eu acho que só o tempo consegue fazer com que, na minha cabeça, fique tudo como antes. Desculpa, Mili.
- Já passou, Marco –
Milicent bocejou naquele momento, olhando para o relógio. Já era quase dez da noite e ela estava cheia de sono.
- Dorme, meu amor.
- Aqui? Acho que a nossa cama é melhor. E, além disso, temos o Marten lá em cima.
- Tens razão.
- Como sempre –
Milicent riu-se, dando-lhe um beijo a Marco. Os dois levantaram-se e começaram a subir as escadas – vai andando, vou buscar bolachas.
E assim foi, Milicent foi até à cozinha, procurou o pacote das bolachas que queria e foi para o quarto. Marco já estava deitado, mexia no telemóvel e tinha o comando da televisão do seu lado. Milicent olhou para o televisor, rolando os olhos.
- Eu não acredito…
- No que? –
Milicent sentou-se na cama, perto de Marco que passou a perna que tinha gesso por cima da de Milicent, parando de mexer no telemóvel.
- Tu não viste o jogo comigo…e agora estás a vê-lo.
- Prometi ao Mario que o via e agora ele está a fazer-me perguntas. Oh e até me interessa um bocadinho.
- É só um bocadinho é…
- Dá-me bolachas.
- Não. Depois ficas gordo.
- E tu não?
- Não. A partir de agora serei sempre gorda por causa da gravidez.
- Não digas asneiras. Quase já nem se nota a tua barriga.
- Isso é aos teus olhos, o espelho não diz isso.
- Porque ele não vê bem.
- Sim, sim, e tu vês?
- Vi-te a ti…apaixonei-me e olha para nós aqui? Acho que vejo bem, sim.
- Parvo –
Milicent abriu o pacote das bolachas, dando duas a Marco – o resto fica para mim.
- Parece-me justo –
o som do telemóvel de Marco interrompeu-o – mais mensagens do Mario…eu não sei nada do jogo! 
- É melhor veres então… - Milicent pegou no seu telemóvel, fotografando o que tinha na sua frente.

Preguiça. Ele vê o jogo, o filho dorme e eu como bolachas! Foi um dia, daqueles!


- Milicent, a sério, o teu filho não se vai calar se tu não pegares nele.
- Oh Marco… -
já era a terceira vez que Marten acordava naquela noite, era a vez de Marco mas ele não sabia o que fazer. Milicent sentou-se na cama, vendo que Marco o embalava sentado na beira da cama – dá cá o menino – Marco virou-se para trás e Milicent precipitou-se na direcção dele para segurar o filho.
De olhos fechados e a bocejar começou a embalar o filho.
- Será do calor? – Perguntou Marco, fazendo com que Milicent abrisse os olhos.
- Pode ser – olhou para Marten que continuava a chorar – ele está muito quente.
- Deve ser mesmo o calor…
- Não Marco, ele está com febre.
- Febre?
- Sim e, antes de lhe dar qualquer medicamento, precisa de ir já para um banho tépido.
- É tão bom que a mãe do meu filho seja pediatra. Ficas calma, ele fica calmo nos teus braços –
o choro de Marten tinha-se tornado mais fraco - e o bebé e tratado como vip.
- Segura nele –
Milicent passou Marten para o colo de Marco, indo buscar o termómetro – tira-lhe a febre enquanto eu vou preparar a água.
Milicent foi até à casa de banho, preparando a banheira do filho com água tépida para ajudar a febre a baixar.
- Mili? – Marco não precisou de falar muito alto já que a porta da casa de banho estava aberta. Milicent olhou para ele, que olhava para o termómetro – ele está com 39.9. É muito, não é?
- É. Esquece o banho –
Milicent fechou a torneira, indo até ao quarto. Abriu o roupeiro, retirando alguma roupa para vestir – tenho de o levar ao hospital.
- Porquê…?
- Está demasiado alta para um bebé de um mês. Ele pode ter convulsões, ficar mais irritado e eu não tenho como o medicar sem saber o que é que ele tem –
enquanto ia falando, Milicent vestiu-se – precisa de fazer análises, de ser auscultado e ver qual o medicamento certo.
- Porque é que achas que a febre surgiu?
- Ele é pequeno, Marco. Estas temperaturas são muito fortes para ele… -
Milicent pegou em Marten ao colo, dando um beijo na testa de Marco – fica descansado.
- Não, eu vou com vocês. Achas que eu fico aqui? –
Milicent sorriu, vendo-o levantar-se – vamos.
- Vais assim?
- Calças de fato treino e t-shirt? Está feito, vá vamos.

Milicent pegou na mala com todos os documentos de Marten, pegou na sua mala e desceu as escadas, vendo que Marco também as descia. Foi até ao exterior da casa, colocou Marten na sua cadeira e as malas no banco do lado do condutor. Marco saiu de casa, fechou a porta e entrou no carro, ficando ao lado do filho. 
Dirigiram-se para o hospital, com calma e a tentarem acalmar Marten enquanto ele chorava. Milicent estava preocupada…podia ser pediatra e saber que poderia ser apenas uma febre. Mas era o seu filho, não conseguia encará-lo apenas como médica.
 
 
 
Olá meninas!
Peço imensas desculpas por não publicar à algum tempo mas o tempo livre começou a ser menos e aproveitado de outras formas.
Contudo, deixo-vos aqui um capítulo que espero que gostem. Deixem os vossos comentários com opiniões/sugestões.
Beijinhos.
Ana Patrícia